Na última quinta-feira, o vereador Genivan Vale (PR) recebeu a reportagem do O Mossoroense em seu escritório de trabalho para uma entrevista esclarecedora sobre a situação na saúde. Membro da Comissão de Saúde da Câmara e um dos políticos que mais conhecem o assunto em Mossoró, o republicano traça nesta entrevista, em que a política partidária ficou em segundo plano, um raio x do caos na saúde em Mossoró. Explica a origem do problema na forma como os recursos federais são repassados e faz um apelo pelo fim da influência política nos critérios de repasses que a Prefeiura de Mossoró faz aos hospitais.
O Mossoroense: Estamos vivendo um dos momentos mais críticos na área da saúde na história de Mossoró. Na sua opinião, a que se deve isso?
Genivan Vale: Olha... inicialmente a gente sabe que existe um subfinanciamento na saúde. O Governo Federal é o único ente da Federação que não tem definição na Constituição de quanto deve gastar com saúde e o que realmente é gasto com saúde. Além desse empecilho, nós sabemos que alguns estados e municípios têm essa determinação constitucional, mas usam esse dinheiro da saúde para outros fins e dizem que é dinheiro para a saúde. Então, você junte esses problemas que são o subfinanciamento, pouco dinheiro, gastos de dinheiro da saúde que não são com a saúde, má gestão em alguns casos e aí chegamos a essa bomba que estamos vendo. Além disso, ainda ficando no plano federal, tivemos no governo Fernando Henrique o Proer, que foi um movimento para salvar o sistema bancário brasileiro que é hoje um dos mais sólidos e confiáveis do mundo. Na época houve muita crítica dos petistas quando os tucanos fizeram essa proteção. Diziam que era só para proteger os banqueiros e a gente viu que na realidade serviu também para proteger quem tinha o seu dinheiro no banco. Com o governo de Lula veio também um gasto em todos os ministérios para proteger a indústria automobilística. Aí você pode me perguntar se sou contra essas medidas e eu direi que não. Agora eu pergunto por que não há essa mobilização nacional para salvarmos a saúde. Por que não há essa mobilização política para que possamos procurar todas aquelas entidades que tratam a saúde sem fins lucrativos, hospitais públicos e salvar. Isso deveria partir do Governo Federal que é quem mais arrecada. Voltando para o nosso plano municipal e estadual. Entendo que faltou planejamento nos governos estaduais e municipais. Nós temos uma cidade com a população crescendo e os números de hospitais diminuindo e a gestão é plena. Isso significa que o município teria que se preocupar com isso. O que está acontecendo que os hospitais estão fechando. O município deveria elaborar um diagnóstico e chamar a todos para juntos, independente de cor partidária, fazermos uma campanha para salvarmos o SUS em Mossoró.
OM: Por que isso não acontece?
GV: O que acontece? Ficam nesse jogo de empurra-empurra e o pobre, usuário do SUS, fica sempre levando pancada na cabeça, sendo humilhado nas portas dos hospitais públicos e particulares que tem convênio com o SUS. A gente acha isso inadmissível. Fiquei me perguntando agora: antes ficavam sempre jogando a culpa no Governo do Estado, acusando a governadora Wilma e o governador Iberê de não repassarem os recursos. Agora estamos há um ano no governo de Rosalba que é aliada da prefeita Fafá, e agora? O problema se agravou. O Governo do Estado já não é mais o culpado. Os culpados agora são os médicos? Os usuários do SUS? São todos os profissionais que estão empenhados em fazer o SUS funcionar? Ficam essas perguntas aí para que a gente possa descobrir quem são os culpados.
OM: Durante toda essa polêmica nos últimos dias houve uma tentativa de parte da prefeitura de culpar os anestesiologistas. Na sua opinião, essa é a versão correta?
GV: Estão sempre puxando essa história do juramento dos médicos e eu pergunto a quem está nesse momento lendo o jornal: alguém trabalha de graça? Então não adianta vir querer culpar os médicos que são profissionais que estão lutando pelos salários deles. Alguns chegam a ter três meses de salários atrasados e aí não são só os médicos. Os médicos muitas vezes possuem outras fontes de renda, mas e os auxiliares de serviços gerais que deixam a sala de cirurgia limpa? E os técnicos e auxiliares de enfermagem? Esse pessoal ficar três, quatro meses tem ambição em querer receber? Quem é que repassa esse dinheiro por ser gestão plena é o município. Quando ele atrasa a uma empresa ou instituição onde 90% do faturamento é pelo SUS ela com certeza vai atrasar os salários dos funcionários. A gente lamenta esse jogo de empurra da prefeitura. Antes ela dizia que a culpa era do Governo do Estado e agora culpa os profissionais da saúde, em especial os médicos.
OM: Como o senhor vê o papel do deputado Leonardo Nogueira, que é médico, nesse episódio?
GV: Lamento muito que um colega da área da saúde, militante com mandato que é doutor Leonardo. Ele deveria ter abraçado essa causa da saúde e em especial a questão da maternidade que durante anos e anos ele fez parte dela. É triste que ele venha a público condenar seus colegas, dizendo que está havendo ambição e dizendo quanto os médicos ganham. Não adianta esse tipo de atitude para jogar a população contra os profissionais médicos. Ele tem que vir para o epicentro do problema e chamar os colegas para resolver o problema. Tentar jogar a população contra a classe médica só me dá uma certeza: a de que isso não funciona.
OM: A questão política tem impedido uma solução para o problema?
GV: Eu acredito. Inclusive disse na quinta-feira da semana passada em conversa com doutor Laete, doutor André e Vânia Bolão numa visita em que fui colher subsídios para que a Câmara possa fazer alguma coisa eu disse isso: que esse estresse político entre o grupo da prefeita Fafá e o grupo da deputada Sandra Rosado tem atrapalhado. A gente sabe que a maternidade pertence a um grupo adversário dos atuais ocupantes do Palácio da Resistência e a gente sente que há má vontade nesse processo todo e a gente não gostaria de ver esse tipo de coisa e Laete me confessou uma coisa e disse: 'Genivan, eu tenho quase 40 anos aqui dentro e desde menino vejo Mossoró com esse tipo de atitude política'. Isso é lamentável. A gente espera que os grupos políticos possam crescer e amadurecer para que a gente não veja mais esse tipo de problema que só tem um perdedor que é o povo de Mossoró. Peço aqui a serenidade de todos os grupos para que a gente não veja fechar mais um hospital em Mossoró.
OM: Sempre vejo os seus discursos na Câmara e vejo um enfoque na falta de gestão no Executivo municipal na área da saúde. Na opinião do senhor, levando em conta o que se gasta com festas, praças e propaganda, esses recursos não dariam para construir uma maternidade pública aqui em Mossoró?
GV: Com certeza. Na realidade não é uma questão de gestão, mas de prioridade. O município alega que gasta mais do que deveria com saúde, ou seja, mais do que a Constituição preconiza. Aí eu pergunto: se na nossa casa nós temos que fazer uma feira e só temos R$ 300 e de repente temos mais um filho e esse dinheiro não dá mais. Nós vamos deixar o filho morrer de fome? Nosso parente morrer de fome porque a gente estipulou que só teria R$ 300 para gastar com a feira? Claro que não. Do mesmo jeito é o município. O que determina a Constituição é de que se deve gastar pelo menos 15% do orçamento, mas se não está dando nós vamos ficar só nesses 15%? É aí que vem a questão que eu bato: a prioridade. Somente nos últimos três anos do governo Fafá foram gastos entre R$ 26 R$ 27 milhões em festas e propaganda. Não é o vereador Genivan Vale quem está dizendo, acessem o Portal da Transparência. Lamento essa inversão de prioridades. Não tem propaganda melhor do que o cidadão sair dizendo que mora numa cidade que tem um atendimento público de qualidade na saúde. Não tem propaganda melhor do que a pessoa humilde todo mês ir ao posto de saúde do bairro e o remediozinho da diabetes e da hipertensão estar lá. Não tem coisa pior do que a gente pegar dinheiro público e pagar a profissionais para inventar histórias na TV dizendo que está tudo as mil maravilhas a gente sabendo que não está. Os novos gestores que virão precisam mudar esse modus operandi de alguns gestores, em especial aqui do Nordeste, de querer incutir na cabeça da população que está tudo as mil maravilhas quando na verdade não está. O cara vai a um posto de saúde e falta medicamento e quando chega em casa liga a TV e estão dizendo que Mossoró é a melhor cidade do mundo para se morar. Não bate a propaganda com a realidade.
OM: Russas é quatro veses menor que Mossoró e a essa altura deve estar tendo muita propaganda por lá...
GV: ... Lamentável né! Eu acho que o prefeito de lá deve estar se perguntando como uma cidade do porte de Mossoró precisa da ajuda de uma cidade de 70 mil habitantes. Lamento isso. A gente precisa ter serenidade e não esquentar a cabeça e resolver os nossos problemas. A gente precisa acreditar nos nossos gestores. Temos capacidade de ter uma grande rede hospitalar e não temos. A classe média e a classe média alta estão indo ter seus filhos em Natal e Fortaleza e a gente acha isso inadmissível. Temos que voltar a ter o choro das crianças em nossa maternidade.
OM: Voltando a essa questão do contrato dos anestesiologistas. A prefeitura afirma que não quebrou o contrato e os profissionais dizem o contrário. Quem tem razão nessa história?
GV: Na realidade, Bruno, a gente tem visto algumas declarações e todos viram alguns veículos tentando jogar a população contra os médicos, dizendo que eles só pensam em dinheiro. Não vamos dizer que a classe médica está 100% correta. A gente sabe que todas as áreas têm os bons e os maus profissionais e a classe médica não é diferente. Agora a grande maioria da área de saúde é composta de pessoas sérias. Mulheres e homens dignos. A gente lamentou isso. Estou aqui e já lhe mostrei os documentos da Gerência da Saúde datado de 23 de dezembro informando que a partir de 1° de janeiro de 2012 não iria mais pagar o SUS para gestantes que viessem de fora. Aí a gente pergunta: o médico vai ficar na calçada da maternidade dizendo: "Você que é de Mossoró entra, você que não é vai embora". Isso é o gestor que tem que fazer. No dia 27 o doutor Ronaldo Fixina enviou documento em resposta comunicando que a partir do dia 1° de janeiro, às 7h, não ia mais atender os pacientes do SUS e que não haveria mais atendimento na Apamim, na Maternidade Almeida Castro. A gente ficou se perguntando por que esperaram acontecer todo esse drama com essas jovens senhoras que precisaram dar à luz entre o dia 1° e o dia 3 quando houve toda essa confusão. O serviço voltou, mas de forma reduzida. Está lá o atendimento sendo feito numa única sala e com a UTI fechada. A gente não pode concordar com isso.
OM: Como a Câmara Municipal pode colaborar para solucionar esse problema?
GV: Solicitei ao presidente da Câmara Municipal que convocasse todos os vereadores para uma reunião extraordinária. Essa é a hora da Câmara dizer por que é que é preciso um Legislativo na cidade. É hora dos vereadores esquecerem o lado político, as cores de seus partidos e lutarem por essa causa que é do povo de Mossoró.
OM: Qual foi a posição do presidente da Câmara?
GV: Ele disse que iria consultar a assessoria jurídica para realmente ver o que a Câmara poderia fazer. Estou aguardando. Já liguei para outros vereadores e todos com quem conversei concordam e estamos aguardando uma manifestação do nosso presidente.
OM: Falando agora de política partidária. Como está a situação do PR? O partido está definitivamente liberado para fazer a aliança que quiser em Mossoró independente de João Maia ir ou não para a base da governadora Rosalba Ciarlini?
GV: Eu, diferentemente de alguns que dizem que o partido está isso ou aquilo... nós temos tido conversas com o deputado João Maia e sempre que tenho conversas sobre o partido gosto de levar alguém para ouvir. Na última conversa que tivemos levamos o nosso digníssimo Marcelo Batista Rosado, o presidente do partido, e o suplente de vereador Vingt-unzinho e foi isso que ele me disse ao perguntar a situação de Mossoró e nós fizemos um breve resumo de como estava e ao final ele perguntou qual era a nossa linha e eu pedi ao deputado que convencesse a executiva estadual porque a executiva municipal e o nosso mandato queríamos seguir junto com a oposição. Na frente desses que citei anteriormente, ele disse que poderíamos seguir o nosso rumo e tomar uma posição entre janeiro e fevereiro. Sou uma pessoa que sempre acredita nas pessoas e não posso jamais duvidar do deputado João Maia. Até agora, pelo que tenho visto, ele sempre tem cumprido a palavra mesmo que ele venha mais à frente se arrepender ou ser prejudicado por ter dado a palavra naquele momento. Eu acho que em Mossoró não será diferente e aqui teremos a liberdade de seguir na base de apoio da presidente Dilma que faz oposição à atual prefeita de Mossoró.
OM: Se hoje não fosse 5 de janeiro (a entrevista foi gravada na última quinta-feira) fosse 5 de junho, o PR seguiria com PSB ou PT?
GV: Eu não posso falar uma única palavra pelo partido porque ainda não reunimos a executiva. De minha parte eu preferiria que a oposição estivesse unida sem sair com dois candidatos. Acho que a oposição tem dois grandes candidatos. Tem um nome já massificado e testado que é o da deputada Larissa Rosado e tem outro que é uma surpresa de origem humilde que provou que é possível vencer na vida através do estudo e do trabalho que é o magnifico reitor Josivan Barbosa. Então temos dois grandes nomes. Precisamos ter serenidade para unir a base de apoio a presidente Dilma e continuar esse belíssimo trabalho que vem sendo feito a nível nacional e local. Mossoró precisa ter consciência de que temos que distribuir renda e ter uma ação social mais efeitiva e não temos isso aqui há anos. Por isso essa explosão de violência e tanta gente de fora vindo pegar os nossos empregos, porque não estamos capacitando os nossos jovens, nem dando uma condição digna aos nossos munícipes.
*Jornal O Mossoroense (Bruno Barreto)
Nenhum comentário:
Postar um comentário